sexta-feira, 17 de junho de 2011

Post Scriptum

Há quem defenda que as eleições do passado 5 de Junho premiaram os partidos de direita, apostando de forma convicta na mudança de governo, e que os resultados também penalizaram os partidos à esquerda do PS. Eu penso de forma diversa, penso que as eleições revelaram que os portugueses penalizaram sobretudo o PS, rejeitando a anterior liderança do PS e principalmente o seu estilo de liderança, que o marcou nos últimos anos.
Não se pode afirmar que foi uma surpresa. Quem o fizer quer suavizar o que aconteceu, não aproveitando para reflectir de forma séria acerca dos resultados eleitorais. Apesar das inúmeras sondagens terem tardado em produzir a antecipação da vitória do PSD, era claro para quem acompanhou a campanha que havia uma forte vontade de mudança dos portugueses e foi evidente que houve falta de mobilização convicta da parte dos socialistas. 
Alguns como Mário Soares, Henrique Neto e António Barreto afirmaram e escreveram que era necessário o PS adoptar outra atitude no seio do governo e no seu próprio seio, com vista a haver mais aproximação aos reais problemas dos portugueses, adoptando uma postura mais positiva, que transmitisse esperança aos portugueses e terminando definitivamente com a postura politicamente beligerante que procurava incutir medo da mudança.
Prevaleceu, no entanto, o autismo característico dos que sempre consideraram que qualquer opinião diversa era ‘oposição interna’, e não como uma forma de contribuir para a necessária melhoria da acção governativa que pudesse ajudar a produzir melhores resultados.
O que mais me custa é ter sentido que, principalmente na última fase do anterior governo, o PS se afastou do seu ideário, da sua matriz de valores, posicionando-se longe da sua raiz política de esquerda. Isto foi visível mais pela postura adoptada por alguns, de sobranceria para com os demais, de alguma arrogância política, de autismo extremo e, o mais lamentável, uma postura de quem detém toda a sapiência política. Não houve, em momento algum, o reconhecimento de quaisquer erros, não houve humildade na forma de estar. Não se registou qualquer capacidade de valorização da diversidade, ou o acolhimento de opiniões diferentes.
A liderança política do PS era forte mas rodeou-se apenas dos que nunca discordaram, e sempre concordaram sorrindo, mesmo que por vezes pensando de outro modo, e que colocaram os interesses de curto prazo acima dos interesses gerais e de longo prazo. O poder cegou. A forte liderança política do PS assentou naqueles que foram os batedores de serviço, porque eram os mais aguerridos na defesa intransigente da única verdade oficial, e que nem perderam tempo em debater alternativas, em estabelecer compromissos, pontes, consensos internos para enriquecer a liderança que procuravam belicamente defender, mas que ajudaram a afundar.
Não era preciso ter sido assim, mas infelizmente foi assim.
Por Rui Saraiva, In Semarário Grande Porto - 17 de Junho de 2011

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Yes Men

Para quê dar mais valor aos que nos contraditam com bons argumentos e que, de forma sustentada, nos fazem repensar e reponderar as nossas anteriores certezas, do que o valor que damos aos que bem repetem as nossas ideias e bem nos sabem elogiar?
O Ego humano tem uma crescente dimensão directamente correlacionada com o alimento que lhe forem dando. Quantos mais elogios nos fazem, quantos mais seguidores temos, quantos mais repetidores das nossas ideias, mais necessitamos de estar rodeados por quem assim nos valoriza. Formamos à nossa volta uma corte homogénea e o mais possível igual a nós, se possível em tudo, gestos, gostos, hábitos, tiques, expressões faciais, vestuário e linguagem.
Se alguém ousa sair do alinhamento, ou não tem regresso, ou passa a estar integrado para ser o bôbo, de quem todos nós nos possamos rir, se possível às gargalhadas, quando, e só por piada, ousa dizer algo diferente de nós, ou quando, com graça, se atreve a contrariar uma ideia por nós defendida.
Todos os dias acordamos e saímos confiantes dos sucessos que vamos com toda a certeza alcançar, até porque estarão lá sempre os que decerto tratarão de nos bater palmas pelo que dissermos, ou pelo que fizermos. Serão os guardiões da nossa felicidade e a garantia das nossas conquistas.  
Para ter acesso a este grupo mais restrito, é preciso saber ser melhor na forma como consegue contribuir para o engrandecimento dos feitos do ‘chefe’.
Primeiro é preciso ser apresentado a um elemento do grupo e saber conquistá-lo. E a conquista deve passar sempre, numa primeira fase, por começar a enaltecer esse mesmo membro do grupo, que também é como o ‘chefe’, pois também lhe copia o gosto pelos seguidores e por aqueles que o acham ‘muito bom’, apenas superado pelo próprio ‘chefe’.
Depois de muito elogio e seguidismo, quando há a oportunidade de conhecer o ‘chefe’, deve-se saber escutar e saber concordar com a sapiência demonstrada. Fazer perguntas, muitas, mas sem que essa atitude revele querer questionar o que é dito, tão só para se mostrar muito interessado no que o ‘chefe’ pensa.
A conquista final passa por decorar muito bem a ‘mensagem’, e saber ser um dos melhores a propalá-la. Nesta fase, tem de se ser convincente… tal com o ‘chefe’. A ‘mensagem’ tem de ser passada com afinco e muita confiança. Aqui é que se destacam os melhores dos melhores, aqueles que conseguem ganhar espaço e visibilidade na forma como repetem com capacidade de persuasão dos demais crentes.
São os ‘Yes Men’ quem melhor fortalece os ‘chefes’, mas também são eles que provocarão, mais cedo ou mais tarde, a sua queda.

por Rui Saraiva, publicado In Semanário Grande Porto em 3 de Junho de 2011