sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Democracia Nova


O crescente afastamento dos cidadãos da política e dos políticos é recorrentemente tema de reflexão e os índices de participação dos cidadãos na vida pública têm-se vindo a degradar. Deste facto resultam os cada vez maiores níveis de abstenção registados nas sucessivas eleições, quaisquer que sejam os motes das mesmas, sejam para a escolha de presidentes, sejam para a escolha de governos nacionais, regionais ou autárquicos.

Não podemos insistir em apenas criticar os cidadãos pelo seu afastamento da política, temos também que reflectir na responsabilidade dos políticos para essa realidade. Até porque também assistimos a movimentos de cidadãos, que se têm manifestado a favor de uma mudança profunda na forma como temos sido governados. E esses movimentos de cidadãos, muitas vezes multiplicados num ápice, pela massiva utilização das novas tecnologias e das novas plataformas de comunicação como são as ‘redes sociais’, têm tido muito elevados níveis de adesão e de participação, que intrigam até os mais atentos.

Estaremos perante uma mudança da ‘Democracia’ tal como a conhecemos?

Não podemos negar que é essencial repensar todo o sistema político, e redesenhar toda a arquitectura do ‘edifício democrático’, sob pena da democracia poder ser cada vez mais posta em causa, por aqueles que aguardam na penumbra, aproveitando as normais e simples falhas deste sistema político, para o tentar destruir, propondo o regresso a sistemas autoritários ou ditatoriais.

“… a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos…” afirmou Winston Churchill há mais de 50 anos.

Saber integrar as novas formas de participação cívica, através das novas tecnologias e das ‘redes sociais’, abrindo e modernizando os partidos, melhorando a ligação dos políticos aos cidadãos, tornando mais públicas e transparentes as decisões, com vista à maior responsabilização dos decisores, mas sobretudo de quem neles votou, é apenas o início de um longo caminho que irá contribuir para a grande transformação da democracia, em que no final todos os cidadãos se sentirão mais participantes do destino comum.

Devem ainda encetar-se algumas mudanças nas actuais leis eleitorais, tais como, aprovar desde já uma nova reforma da lei eleitoral autárquica. Lei essa que possa ser já implementada nas próximas eleições autárquicas de 2013, e que imponham que só tenhamos de votar na eleição dos deputados para as Assembleias Municipais, e que do partido mais votado nessa votação saia a designação de um executivo municipal ‘monocolor’.

Ficaria assim equiparada a fórmula de constituição dos executivos municipais ao actual modelo de formação dos governos nacionais. O poder das Assembleias municipais deveria ser muito reforçado, quer no seu papel fiscalizador, quer ainda no seu papel de sustentação do governo municipal, ou de aprovação dos documentos fundamentais, como sejam os orçamentos, e ainda ficaria com o poder de derrube do executivo, por aprovação maioritária de moções de censura.

A tão desejada aprovação de uma revisão da lei eleitoral para a Assembleia da República seria também fundamental. Primeiramente com a redução do número de deputados para um máximo de 180, tal como já é permitido na actual redacção da lei constitucional, seguidamente com a aprovação dos círculos uninominais, complementada por um círculo nacional que reponha a proporcionalidade nacional da votação. Assim, todos saberiam em quem votavam, e em quem voltar a confiar ou quem não querer reeleger, pela avaliação que deles fariam do seu desempenho, não apenas na participação escrupulosa e activa no plenário da AR e nas comissões, mas também pela correcta e contínua ligação que cada deputado consiga estabelecer com os cidadãos eleitores do seu círculo eleitoral.

Rui Saraiva
Gestor


Publicado In Semanário Grande Porto - 26 de Agosto de 2011

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Administração Pública

Num momento em que todos sentimos as dificuldades de estarmos a passar por uma das maiores crises das nossas vidas, precisamos abordar de forma aprofundada alguns assuntos, que apesar de até há bem pouco tempo não serem considerados prioridades, por força das dificuldades subiram rapidamente para o topo delas.
Hoje fala-se e escreve-se muito sobre a dimensão do Estado e sobre o seu papel. Esgrimem-se publicamente argumentos diversos e até contrários acerca das duas dimensões, com uns a defenderem um Estado maior e outros a quererem reduzi-lo por considerarem mais marginal o papel que lhe querem atribuir.
Mas todos confluem num diagnóstico, tal como está o Estado não é sustentável.
Não o querer discutir para que o possamos redesenhar é ser-se irresponsável por se querer esconder um problema que já existe, porque o Estado já não tem recursos financeiros para cumprir as suas tarefas mais básicas.
É necessário então saber-se que Estado se quer e qual a dimensão que deve ter para que possa cumprir essas funções que se lhe pretendem incumbir.  
Devemos dotar dos meios necessários o Estado para que este possa assegurar um Sistema de Ensino Público, permitindo a todos os cidadãos o aceso à igualdade de oportunidades para o seu desenvolvimento integral; para que este possa assegurar um Sistema Nacional de Saúde público, garantindo que os cuidados de saúde são universais e independentes da capacidade financeira dos cidadãos; para que este possa gerir um Sistema de Segurança Social público que garanta uma protecção social aos mais carenciados, aos cidadãos que por motivos inesperados se vejam em situações de desemprego, ou que garanta uma sustentabilidade digna aos cidadãos que pela idade se reformaram após toda uma carreira profissional contributiva para esse mesmo sistema. 
Este Estado não pode continuar assente num edifício administrativo desenhado sob as  premissas do Séc XIX.
Devemos acabar o mais imediatamente possível com os distritos e devemos instituir rapidamente as cinco regiões no continente. É uma decisão que cabe tomar sem quaisquer adiamentos e sem ‘referendos’. Se na Constituição portuguesa existe a ‘obrigação’ de referendar este assunto, então que uma maioria de 2/3 dos deputados na Assembleia da República votem a alteração da Constituição, retirando-lhe essa ‘obrigação constitucional’.
Uma regionalização que absorva as actuais administrações descentralizadas do Estado, garantindo a sua melhor coordenação num âmbito regional, reduzindo os meios humanos e os recursos materiais que lhes estão afectas e sobretudo agilizando decisões, tornando-as mais rápidas e mais correctas. Uma regionalização que torne mais transparente a acção do Estado, por tornar as decisões mais próximas dos cidadãos, e por também permitir que o Estado regional seja alvo de avaliação e escrutínio no fim de cada ciclo de quatro anos.
Avançar para a fusão de algumas autarquias, sejam elas juntas de freguesias sejam elas câmaras municipais, mas apenas no litoral do continente português, também iriam assegurar a simplificação da administração pública.
Entre outras, estas duas medidas permitiriam reduzir bastante o edifício administrativo do Estado permitindo-lhe focar-se no papel essencial que lhe deve caber.

Rui Saraiva
Gestor

Publicado no Semanário Grande Porto - In 12 de Agosto de 2011