sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Portugal does matter

Portugal é tão importante para a Europa como a Europa é importante para Portugal. Há um equilíbrio quase perfeito na importância que cada um destes espaços políticos e económicos tem relativamente ao outro.
A Europa encontra-se perante um ciclo de estagnação económica e sob uma clara crise financeira de dimensão nunca antes ocorrida. A possibilidade de conseguir encontrar soluções internas ao seu próprio espaço para os dois problemas é muito limitada. Enquanto que no caso da crise financeira e da moeda única a solução radica fundamentalmente em decisões políticas próprias, que tardam em ser tomadas, a resolução da crise de crescimento económico só produzirá resultados com o efectivo aproveitamento da actual fase de acentuado crescimento económico dos países emergentes localizados maioritariamente no hemisfério sul.
O nosso país, devido à sua excelente localização geográfica apresenta-se como uma porta de entrada e saída perfeitas para as ligações comerciais entre a Europa e o resto do mundo. É um rectângulo logístico central exemplar para todos os países europeus utilizarem no alcance de outros continentes, e é uma plataforma incomparavelmente adequada para uma primeira instalação dos agentes económicos originários dos países de fora da Europa que nela quiserem entrar.
A predominância da língua portuguesa no hemisfério sul, disseminada pelos vários continentes, desde a América do Sul, a África, e pontualmente pela cada vez mais liderante Ásia permite a Portugal ser um interlocutor perfeito com os países deste hemisfério. A lusofonia apresenta-se assim como facilitadora das relações comerciais e económicas entre a Europa e todo o hemisfério sul.
A relação histórica que une Portugal às suas antigas colónias e a forma como Portugal sempre soube integrar, e não explorar, as riquezas naturais desses territórios, deixando a sua marca, a sua língua, património, história, não hostilizando os povos nativos dos novos territórios onde se instalava, trocando benefícios com eles, leva a que sejamos bem considerados nas relações que ainda hoje temos com esses povos em todo o mundo.
O papel de Portugal, fruto da atitude e do grau de compromisso que os seus mais altos responsáveis têm tido na sua participação em diversos projectos de vários organismos da ONU, quer no apoio aos refugiados, quer na sua participação em forças de pacificação ou de manutenção de paz, ou ainda no estabelecimento de condições seguras de transporte e circulação marítima no Oceano Índico, e ainda o papel preponderante e decisivo no apoio à autonomia de Timor Leste leva a que haja um grande reconhecimento internacional do nosso país.
Portugal tem já e terá cada vez mais um papel fundamental como embaixador político mas sobretudo como intermediário económico, papel esse tão necessário a toda a União Europeia, cimentando e aprofundando as relações económicas, comerciais e financeiras com as novas economias emergentes, que serão as economias liderantes no contexto mundial, num muito curto prazo.

Rui Saraiva
Gestor


Publicado In Semanário GRANDE PORTO - em 30 Dezembro de 2011

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Economic Clima Boosting

Podemos hoje afirmar que o único carácter distintivo do EURO radica no facto da arquitectura do seu edifício institucional não estar devidamente completa no que toca aos mecanismos associados às políticas monetaristas.

As célebres intervenções do Banco Central Europeu (BCE) nas compras de dívida soberana que tem efectuado nos mercados secundários não têm sido suficientes para acalmar os ‘mercados’ nem mesmo os seus ‘agentes’. Estas tentativas de cura estão a contribuir para acelerar a morte dos doentes. Estas compras estão a provocar uma quebra muito acentuada na circulação da moeda única, o que passou também a ser uma causa adicional da falta de liquidez nos mercados financeiros, contribuindo para a cada vez mais visível estagnação da economia europeia.

Urge assim que seja tomada de forma uníssona por todos os países membros do ‘Eurogrupo’ uma posição concertada que confira ao BCE as ferramentas adequadas para uma correcta actuação na gestão da crise da zona euro. Todos os países da ‘eurozona’ devem concordar em alterar os estatutos do BCE conferindo-lhe a capacidade de realização adicional de dois fundamentais papeis.

Um primeiro será a possibilidade de emitir moeda injectando liquidez na economia e nos mercados financeiros através do aumento da quantidade de moeda em circulação. À emissão de moeda deve suceder a compra massiva, nos mercados primários, de dívida soberana aos países do euro necessitados. A emissão de moeda deve ser forte para permitir uma significativa desvalorização da cotação do euro face a outras moedas de referência nas trocas internacionais, como são o caso do dólar americano, do iene japonês e do yuan chinês. 

Um segundo papel será a emissão conjunta de dívida de todo o espaço do euro – as chamadas ‘eurobonds’, cujo risco associado será o somatório ponderado dos riscos de cada país membro, ultrapassando as dificuldades individualmente sentidas aquando das revisões das avaliações por parte das agências de rating.  

Será ainda assim necessário dar um último e decisivo passo, com o avanço determinado para uma governação económica e financeira conjunta para toda a zona euro, em que a perda de soberania financeira dos países membros e a perda de autonomia de decisão económica individual será largamente compensada pelo enorme ganho de escala e pela conquista definitiva da tão necessária credibilidade externa.

Para dentro, esta nova liderança deverá impor regras de consolidação orçamental e estabelecer metas de redução de dívida pública e privada, mas deverá aplicar medidas de investimento reprodutivo e indutoras de crescimento económico, reanimando todo o mercado interno.

Para fora, esta governação deverá afirmar o respeito integral pelo cumprimento presente e futuro dos pagamentos dos empréstimos internacionais obtidos, mas ganhando margem para uma nova agenda de concretização desses pagamentos, tentando garantir um período de carência de poucos anos, que permita desafogar no curto prazo a actualmente débil economia europeia, conquistando assim as indispensáveis condições que garantam a capacidade futura de cumprimento desses compromissos.

Finalmente a aplicação de uma tributação sobre as transacções financeiras internas à ‘eurozona’ e sobre as transferências para fora da zona euro, em consonância com medidas idênticas aplicadas por todos os G20, conforme aliás conclusão da última cimeira, permitirá a obtenção de recursos financeiros exclusivamente canalizados para diminuição de dívida e para a realização de investimentos de carácter reprodutivo.

Só a aplicação de todo este programa, sem falhas nem esquecimentos de circunstância, permitirá dar uma forte injecção de alento económico à Europa, evitando a sua implosão.

Rui Saraiva
Gestor

Publicado In Semanário Grande Porto - 16 Dezembro de 2011

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Fado Português


A história do nosso país está repleta de inúmeros episódios de sucessivos encontros com as dificuldades e de enorme obscuridade e muita incerteza sobre o futuro, mas que permitiram que ao longo dos tempos conseguíssemos moldar o nosso código genético adicionando-lhe uma capacidade de resistência e mesmo de resiliência perante as adversidades.

Desde logo as dificuldades sentidas na formação da nossa nacionalidade, que até ficou conhecida pela disputa e posterior guerra entre um filho, nosso fundador, e a sua mãe.

Seguiram-se os obstáculos decorrentes da necessidade de conquista de mais território, alargando para sul um pequeno condado, rechaçando os invasores do norte de África, esses povos mouros que saindo derrotados nos deixaram as suas marcas na nossa língua, na nossa arquitectura e em muitas outras áreas do saber.

Passou-se então à afirmação da nossa independência face à vontade dos nossos vizinhos de Castela e Leão, povo que não se contentou nunca com o facto de não ser também dono deste pedaço de terra, que o impedia de alcançar mais livremente o Atlântico.

Aprisionados no nosso próprio país, voltando as costas à restante ibéria, quisemos descobrir o mundo do além-mar, seguindo imprudentemente as estrelas, trilhando novas rotas e desenhando pela primeira vez os mapas do nosso mundo. Pioneiros, aventureiros, e destemidos passamos o Bojador e as Tormentas que soubemos transformar em Boa Esperança, para que depois todos os povos europeus pudessem nessas novas rotas marítimas estabelecer os novos caminhos para as trocas comerciais com o Oriente.

Tudo isto apesar dos sempre velhos do Restelo que, assistindo à partida dos navios com destino incerto, malfadavam os seus percursos.  

Com os nossos irmãos de Espanha dividimos o mundo, após termos sido os conquistadores, os descobridores e os responsáveis pela descoberta da sua total plenitude e dimensão. Afirmação o nosso domínio geo-político, e soubemos criar laços de sangue e língua com os mais longínquos povos. 

Desaproveitamos e gastamos rapidamente as riquezas obtidas com esse domínio até perdermos o império para os Holandeses e Ingleses.

Integramos a Europa e também desaproveitamos e gastamos rapidamente as remessas que dela recebemos.

Ciclicamente metemo-nos em sarilhos. Estamos sempre a voltar a estar perante grandes tormentas. Parece que estamos destinados a passar dificuldades, e parece mesmo que gostamos do desafio de ter de as ultrapassar.

Será que nos tornamos num povo especialista em ultrapassar as desgraças em que nos metemos? Será esse o nosso fado?

Não terá sido apenas uma coincidência o facto de só agora a UNESCO ter reconhecido o Fado português como Património Imaterial da Humanidade. Espero que os portugueses possam aproveitar este facto para reflectir um pouco e possam decidir ser mais activos e mais participativos na definição e orientação do seu próprio destino, aprendendo finalmente com a sua própria história, não cometendo no futuro os erros do seu passado.

Rui Saraiva
Gestor