Podemos hoje afirmar que o único carácter distintivo do EURO radica no facto da arquitectura do seu edifício institucional não estar devidamente completa no que toca aos mecanismos associados às políticas monetaristas.
As célebres intervenções do Banco Central Europeu (BCE) nas compras de dívida soberana que tem efectuado nos mercados secundários não têm sido suficientes para acalmar os ‘mercados’ nem mesmo os seus ‘agentes’. Estas tentativas de cura estão a contribuir para acelerar a morte dos doentes. Estas compras estão a provocar uma quebra muito acentuada na circulação da moeda única, o que passou também a ser uma causa adicional da falta de liquidez nos mercados financeiros, contribuindo para a cada vez mais visível estagnação da economia europeia.
Urge assim que seja tomada de forma uníssona por todos os países membros do ‘Eurogrupo’ uma posição concertada que confira ao BCE as ferramentas adequadas para uma correcta actuação na gestão da crise da zona euro. Todos os países da ‘eurozona’ devem concordar em alterar os estatutos do BCE conferindo-lhe a capacidade de realização adicional de dois fundamentais papeis.
Um primeiro será a possibilidade de emitir moeda injectando liquidez na economia e nos mercados financeiros através do aumento da quantidade de moeda em circulação. À emissão de moeda deve suceder a compra massiva, nos mercados primários, de dívida soberana aos países do euro necessitados. A emissão de moeda deve ser forte para permitir uma significativa desvalorização da cotação do euro face a outras moedas de referência nas trocas internacionais, como são o caso do dólar americano, do iene japonês e do yuan chinês.
Um segundo papel será a emissão conjunta de dívida de todo o espaço do euro – as chamadas ‘eurobonds’, cujo risco associado será o somatório ponderado dos riscos de cada país membro, ultrapassando as dificuldades individualmente sentidas aquando das revisões das avaliações por parte das agências de rating.
Será ainda assim necessário dar um último e decisivo passo, com o avanço determinado para uma governação económica e financeira conjunta para toda a zona euro, em que a perda de soberania financeira dos países membros e a perda de autonomia de decisão económica individual será largamente compensada pelo enorme ganho de escala e pela conquista definitiva da tão necessária credibilidade externa.
Para dentro, esta nova liderança deverá impor regras de consolidação orçamental e estabelecer metas de redução de dívida pública e privada, mas deverá aplicar medidas de investimento reprodutivo e indutoras de crescimento económico, reanimando todo o mercado interno.
Para fora, esta governação deverá afirmar o respeito integral pelo cumprimento presente e futuro dos pagamentos dos empréstimos internacionais obtidos, mas ganhando margem para uma nova agenda de concretização desses pagamentos, tentando garantir um período de carência de poucos anos, que permita desafogar no curto prazo a actualmente débil economia europeia, conquistando assim as indispensáveis condições que garantam a capacidade futura de cumprimento desses compromissos.
Finalmente a aplicação de uma tributação sobre as transacções financeiras internas à ‘eurozona’ e sobre as transferências para fora da zona euro, em consonância com medidas idênticas aplicadas por todos os G20, conforme aliás conclusão da última cimeira, permitirá a obtenção de recursos financeiros exclusivamente canalizados para diminuição de dívida e para a realização de investimentos de carácter reprodutivo.
Só a aplicação de todo este programa, sem falhas nem esquecimentos de circunstância, permitirá dar uma forte injecção de alento económico à Europa, evitando a sua implosão.
Rui Saraiva
Gestor
Publicado In Semanário Grande Porto - 16 Dezembro de 2011
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