sábado, 20 de abril de 2013

Resgate Cipriota


Na semana passada fomos todos surpreendidos e abalados com o anúncio público das primeiras medidas que estavam a ser defendidas para ‘salvar’ o Chipre da bancarrota.
Este conhecimento público fez tremer não só a Europa, como também o mundo inteiro. Até os mercados financeiros viram repentinamente afundar as cotações dos activos financeiros em todas as principais praças europeias e bolsas mundiais.

Acabávamos de conhecer as intenções de serem taxados todos os depósitos bancários colocados em contas nos bancos cipriotas, numa dimensão situada entre os 20% e os 40% para pagar o resgate do Chipre e salvar os seus bancos.
Estas notícias significaram a ‘morte’ do pilar fundamental e mais importante do sistema financeiro e bancário, que é o princípio da confiança.

Este fundamental princípio em que assenta o sistema financeiro e bancário em todo o mundo, baseia-se no facto dos depositantes acreditarem na segurança das suas aplicações e na boa gestão que as entidades bancárias e financeiras delas fazem. Essa confiança é a base das transacções e das aplicações financeiras em todo o mundo e foi a base da substituição das trocas directas pelas trocas monetárias, e posteriormente o fundamento das aplicações e movimentações financeiras desmaterializadas, ou seja, sem dinheiro à vista.  

Após a forte reacção negativa de todos e com uma forte oposição da opinião pública local e europeia, amorteceu-se o anúncio de duas formas.
A primeira, com a negação da autoria destas funestas intenções e medidas. Percebemos então que foi uma ideia de que ninguém quis assumir a paternidade. A Comissão Europeia virou as costas. O FMI recusou a iniciativa. A Alemanha assobiou para o lado. Todos apontaram o dedo para o infinito.

A segunda com as subsequentes notícias de que o Chipre era uma ‘economia de casino’, e que funcionava como um autêntico paraíso fiscal, onde até os magnatas russos refugiavam as suas avultadas fortunas obtidas de formas muito pouco transparentes. Avolumou-se um conjunto de declarações contra este estado de coisas, concluindo que o Chipre tinha de ‘pagar’ pela sua irresponsabilidade.

Estávamos numa nova fase, no início de uma reformulação das medidas anteriormente órfãs. Passou-se então a pretender publicamente apenas a tributação em 20% dos depósitos acima dos 100 mil euros.

No seio da Europa há já quem esteja a defender o alargamento e a extensão deste tipo de medidas a outros países europeus em dificuldades.

Podemos estar perante o início do colapso mundial de todo o edifício bancário e de todo o sistema financeiro, com consequências imprevisíveis em toda a actividade económica, que poderá sofrer um repentino apagão, tendo como ponto de partida a Europa, que deriva da irresponsabilidade dos líderes políticos e financeiros europeus.
Está definitivamente instalada no seio de todos os lares europeus a desconfiança e ninguém agora consegue afirmar de forma peremptória que os seus depósitos estão imunes a um possível futuro confisco, seja ele parcial ou total.

Esta nova realidade provocará de imediato uma imensa deslocalização e mesmo a fuga de capitais da Europa para outros destinos, sejam eles ou não paraísos fiscais. Será enorme a vontade de transformar as poupanças bancárias em bens de elevado valor, mas ainda facilmente transaccionáveis e de longa duração. Haverá um gigantesco movimento para levantar os depósitos e para guardar ‘as notas’ debaixo do colchão.
Outros espaços económicos mundiais olham para o que está a ocorrer na Europa e têm toda a razão se afirmarem que os líderes europeus só ‘podem estar loucos’.

Rui Saraiva
Gestor

Publicado In Semanário Grande Porto - In 29 de Março de 2013

Sócrates e o PS


O recente regresso de José Sócrates aos palcos públicos nacionais despertou uma série de inquietações em muitos e causou uma enorme instabilidade em vários domínios, seja na comunicação social, seja em todos os partidos políticos, seja nos comentários de todos os que têm intervindo com as suas opiniões na blogosfera.

Fui dos poucos que resisti em reagir a quente. Preferi ficar atento aos desenvolvimentos, e acompanhar o que se ia passando, observando à distância as várias intervenções que iam sendo efectuadas a este propósito.

Muito se escreveu, comentou e especulou sobre as reais intenções de José Sócrates ao aderir ao convite formulado pela RTP, para competir com o programa semanal do dominical Professor Marcelo Rebelo de Sousa, na TVI, canal esse também preferido pelos portugueses.

Quaisquer que fossem, ou ainda sejam, as intenções, este facto provocou em si mesmo uma aceleração em cadeia de movimentos nos diversos órgãos de comunicação social, com uma série de transferências de comentadores políticos que passaram de uns canais para outros, envolvendo quer os canais em sinal aberto quer os seus sucedâneos no cabo.

A bem da liberdade de expressão e de opinião temos hoje um vasto leque de escolhas, da esquerda à direita do espectro político nacional, sendo que qualquer cidadão interessado pela actualidade política consegue agora melhor concluir sobre a realidade que o envolve.

Hoje, que estão passados os primeiros capítulos deste novo enredo, e que estão mais serenados os ânimos políticos, estamos em melhores condições para analisar os impactos presentes e futuros deste ressurgimento.

Há um PS que se mantém fiel a Sócrates, mas que foi derrotado internamente e continua a ser derrotado, apesar de não desistir dos seus intentos, o que foi muito visível na recente tentativa gorada de uma putativa candidatura de António Costa à liderança do PS. Esta fidelidade advém das fortes ligações e interdependências criadas aquando da acção governativa socialista, quando estes lideravam os destinos do nosso país. António Costa fez bem ao ter sacudido os ímpetos dos que o tentavam empurrar , não para o servirem mas para se auto-alavancarem no seu possível percurso político.

Há um PS que muito dificilmente aceitará que haja um novo ascendente político interno da ala socrática, principalmente porque durante o tempo em que Sócrates liderou o PS se sentiu ostracizado e sem voz ou peso dentro do próprio partido.

O PS para ser alternativa ao PSD e para chegar ao governo terá de apaziguar as suas almas mais inquietas e afastar os fantasmas que ainda persistem no seu seio. Estamos perto do melhor momento para isto ser feito que é o próximo Congresso Nacional do PS no final deste mês em Santa Maria da Feira.

Deve Sócrates fazer as pazes com o PS?

Deve o PS fazer as pazes com Sócrates?

A resposta parece óbvia com vantagens para ambos os lados.

Rui Saraiva
Gestor

Publicado In Semanário Grande Porto - In 19 de Abril de 2013