sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Orçamento Cautelar


A proposta do Governo para o Orçamento de Estado para 2014 é um grande acto cénico que encerra vários objetivos em si mesmo.
Mais do que um gesto teatral que visa sobretudo tentar manter uma imagem de credibilidade para quem nos observa de fora, é um duro golpe para todos os portugueses.

É uma derrota para o Governo em primeiro lugar. É uma derrota de Portugal em segundo lugar. É por último uma derrota para todos os portugueses.

Depois de todos os sacrifícios que nos têm sido infligidos, depois de toda a enorme austeridade que tem sido imposta à nossa economia, depois de todos os flagelos sociais de que muitas franjas da nossa população têm sido alvo, os objetivos propostos não têm sido atingidos.

O Governo falhou sucessivamente os resultados que nos foram apresentados como fundamentais para justificar as medidas que nos foram impostas. As receitas não deram frutos, não estão a curar o país da sua principal doença. Apesar do insucesso, há a persistência nos caminhos adotados.

Os métodos adotados para a nossa cura estão a matar o país, empobrecendo a população e enfraquecendo a economia, destruindo a confiança no futuro, desarticulando o Estado, que se encontra em situação de quase pré-falência, fechando aos poucos os seus serviços e reduzindo paulatinamente o seu papel. 

O Governo comporta-se como um administrador de insolvência, assumindo cada vez mais incapacidade de se mostrar capaz de nos salvar.

Prometeram-nos que iriamos voltar aos mercados (em Setembro passado). Não foi verdade. Prometeram que o país iria voltar a ter crédito dos financiadores que assim voltariam a investir em Portugal. Mas os juros subiram na razão direta da nossa falta de credibilidade. E assim, também aqui falharam.
Ora, como a promessa não se concretizou e, em 2014, teremos forçosamente de ter condições para voltar a obter financiamento externo, mas com os mercados fechados na sua vontade de nos voltarem a emprestar dinheiro em voluptuosos montantes, era necessário um passe de mágico.

Construiu-se então este Orçamento Cautelar, com vista a evitar o cenário mais que provável de um 2º resgate, tentando obter as condições para que as entidades europeias e financeiras mundiais, as mesmíssimas que nos resgataram em 2011, voltem a estar connosco, salvando-nos (mas de outra forma e com outro nome). 
Mas a forma encontrada é infeliz.

Assenta na construção de um documento de ilusão porque se propõe atingir metas cujas medidas propostas para atingir esses objetivos ou não são suficientes, ou não são baseados em cenários com grandes probabilidades de concretização.
Assenta num documento que contempla várias normas que contrariam uma vez mais os nossos princípios constitucionais, e portanto é ele próprio o primeiro arremesso de um futuro novo confronto com o Tribunal Constitucional.

Assenta num documento do qual muito provavelmente poderá resultar uma crise política, de cujas responsabilidades o Governo poderá tentar escapar, mas de cujas consequências todos teremos de suportar.                                                          
Rui Saraiva
Gestor

Publicado In Semanário Grande Porto - In 25 de Outubro de 2013

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