Na segunda metade da década de 70 do século passado, assisti durante a minha infância, primeiro inconscientemente, mas depois já com a normal curiosidade pelo mundo e por tudo o que me rodeava, a conversas, a notícias e a informações múltiplas sobre a Europa. Já na década de 80, durante a minha adolescência conheci mais em detalhe durante os meus estudos qual a origem do projecto europeu, com o fim da Segunda Guerra Mundial e com a assinatura do Tratado do Carvão e do Aço e vivi com enorme esperança a adesão de Portugal e de Espanha à então Comunidade Económica Europeia, e mais tarde assisti maravilhado à queda do muro de Berlim, no final dessa década, e o que isso representava com a oportunidade do alargamento do projecto europeu a todo o Leste da Europa.
Até ao início deste milénio todos os povos europeus sentiam dentro de si uma enorme esperança com os vários passos dados no sentido da concretização de um verdadeiro sonho que a integração europeia significava. Estávamos de facto a construir uma união entre os vários povos europeus, com uma comunhão de objectivos, que tinham em vista impulsionarem o desenvolvimento económico, social e cultural deste nosso ‘velho continente’.
Todos os europeus estavam a desenvolver em conjunto um continente repleto de história, pleno de diversidade manifestada nas diversas línguas faladas e escritas, e com uma variedade cultural muito profunda e com antiguidade milenar.
A nossa Europa era não só para os povos dos outros continentes, mas sobretudo para nós mesmos, símbolo de desenvolvimento e prosperidade, terra de oportunidades e de esperança, exemplo de regras sociais humanistas e solidárias, referência de como se podem ultrapassar diversidades e de como se conseguem secundarizar as sequelas das grandes guerras havidas. Sentíamos a nossa Europa imune a qualquer abalo, para todo o sempre. Um espaço único de liberdade de movimentos e de liberdade de expressão.
Foi esse deslumbramento que nos fez a todos esquecer a necessidade imperiosa de a fortalecermos com os fundamentais alicerces que prevenissem as tão inimagináveis e improváveis graves crises futuras.
Aplicamos os nossos esforços a abolir as barreiras alfandegárias, permitindo a entrada, quase sem regra, de produtos de outras origens, até porque esses eram resultado da deslocalização para outros continentes de indústrias que outrora tinham etiqueta europeia. Aprofundamos o estabelecimento de regras severas, mas que apenas aos europeus se aplicavam, no cumprimento de critérios ambientais. Fomos diligentes na aprovação de leis e normativos que impunham a segurança no trabalho e o respeito pelos direitos dos trabalhadores, mas que noutras latitudes não se aplicavam às empresas europeias que lá se tinham instalado.
Governamos a Europa, lendo o mundo aos nossos olhos, pensando que o nosso semáforo iria regular o comportamento dos demais.
É tempo de assumirmos as consequências, mas é tempo de tomarmos as medidas absolutamente necessárias que nos permitam continuar a sonhar.
We all still have an European Dream.
Rui Saraiva
GestorPublicado In Semanário Grande Porto - 4 de Novembro de 2011
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