sábado, 26 de janeiro de 2013

Espiral Recessiva


A estratégia orçamental e financeira que está a ser implementada em Portugal foca-se apenas em adicionar aos cortes já conhecidos outros de que ainda apenas conhecemos as intenções. Esta estratégia assenta apenas numa base de comparação com a riqueza que o país consegue produzir anualmente, comparando o déficit orçamental anual com o PIB do ano respectivo. É uma análise que é exclusiva em termos relativos mas que tem enormes impactos em termos absolutos e está a dar maus resultados. Esta prática tem-nos conduzido a um definhamento económico e a um enfraquecimento social, porque ao mesmo tempo que conseguimos melhorar em termos relativos o déficit orçamental anual, reduzimos brutalmente o valor anual do nosso Produto Interno Bruto.

Os resultados desta estratégia são já por todos conhecidos e estão a acentuar-se de forma galopante, como sejam o ‘enorme’ e imparável desemprego, a catadupa de falências de pequenas e médias empresas, o desaparecimento quase total de alguns sectores da nossa economia, como o sector do imobiliário e da construção, ou o sector da restauração em algumas áreas do nosso território nacional, e por fim o incrível aumento da emigração, cada vez mais qualificada e jovem.

A seguir a cortes de consequências nefastas sucedem-se outros com resultados ainda mais graves. Esta espiral recessiva não tem fim, a não ser o decretar da falência irrecuperável de um povo secular.

Ninguém consegue perceber qual o rumo do país, e o pouco que consegue esperar é um futuro muito sombrio, em que os poucos portugueses e os poucos empresários resistentes vergados pelo enorme peso dos impostos sobre o trabalho, e sob a enorme carga fiscal sobre o consumo, lhes retira a réstia de esperança que tinham num Estado Social, com os profundos cortes anunciados nas três fundamentais funções sociais que são a Escola Pública, a Saúde Pública e a Segurança Social Pública.

Apesar das muitas e sucessivas explicações os portugueses ainda não perceberam porque é que têm de pagar esta pesada factura, mas apenas sabem que são obrigados a assumi-la. Têm-lhes dito que viveram acima das suas possibilidades. Têm ralhado com os portugueses porque estes erraram ao aderir no passado recente aos incentivos que lhe foram dados pelos sucessivos governos nas suas políticas erráticas. Endividaram-se, compraram casa com recurso ao crédito, fizeram férias, ousaram comprar carro, passaram a fazer parte da classe média, enfim ambicionaram usufruir de alguns confortos.

Mas será que são estas as verdadeiras explicações para a nossa actual debilidade?

Não nos podemos esquecer dos ‘padrinhos’ e dos ‘compadrios’, dos ‘consultores’ e dos ‘assessores’, da ‘cunha’, dos ‘lobbies’, e dos ‘grupos de interesses’, dos ‘corporativismos’, e das ‘classes corporativas’, do ‘jeitinho’, da ‘desculpa’, da ‘excepção’ que se foi tornando regra, da dependência dos ‘contratos celebrados com o Estado’, das ‘tomadas de poder no sector bancário’, da ‘falta de fiscalização’ e da ‘falta de regulação’ inexistente em alguns sectores da actividade económica, da entropia de leis e da falta de regulamentação de muitas delas, do excesso de legislação e da falta de estabilidade legislativa e por fim das muitas e sucessivas reformas do aparelho de estado, sem que se lhes desse tempo para a sua correcta execução e fundamental avaliação.    

Actualmente todos os serviços públicos assegurados pelo nosso Estado são já pagos ‘a peso de ouro’. Contribuímos com os nossos impostos, e depois ainda pagamos a utilização de tudo o que é público e que utilizamos. É assim nas Estradas, é assim nos Transportes Públicos, é assim na Saúde, é assim em quase tudo…já pouco sobra.

E perguntamos: porquê pagar? Para quê pagar? Ser solidário mas saber que no futuro ninguém o será connosco?!

Instala-se hoje uma inquietação crescente: será que estamos dispostos a pagar para um Estado que já sabemos que não vamos ter?

Rui Saraiva
Gestor

Publicado In Semanário Grande Porto - In 25 de Janeiro de 2013

Sem comentários:

Enviar um comentário